A luta e a importância das mulheres negras e periféricas para a promoção da justiça social


O dia 14 de março é o dia do nascimento de Carolina Maria de Jesus (1914-1977), notável escritora brasileira, e um dos símbolos de luta e resistência da militância negra.  Neste mesmo dia, 102 anos após o nascimento de Carolina, o Brasil perdia Marielle Francisco da Silva - a Marielle Franco. Socióloga, LGBT, defensora dos direitos humanos e vereadora da cidade do Rio de Janeiro, brutalmente assassinada a tiros junto com Anderson Pedro Gomes, seu motorista.
Embora separadas pelo tempo, as vidas de Carolina e Marielle são emblemáticas para muitas mulheres brasileiras: na grandeza da escritora que antes de se tornar best seller, trabalhava como catadora de papel e, nas horas vagas, registrava o cotidiano da comunidade em que vivia, na zona norte de São Paulo. E na valentia da vereadora que iniciou a luta pelos direitos humanos, após a morte de uma amiga, vítima de bala perdida, num confronto entre policiais e traficantes no Complexo da Maré, zona norte da capital fluminense.
“Eu classifico São Paulo assim: O Palácio é a sala de visita. A Prefeitura é a sala de jantar e a cidade é o jardim. E a favela é o quintal onde jogam os lixos.” Trecho de ‘Quarto de Despejo: Diário de uma favelada’, primeiro livro escrito por Carolina Maria de Jesus. 
Lançada em 1960, esta obra surgiu da ideia do jornalista Audálio Dantas, que durante uma reportagem na favela do Canindé conheceu a escritora e seus escritos, levando-a a trilhar uma história na literatura brasileira. Quarto de Despejo não é apenas um livro com anotações diárias de uma mulher favelada. É também um estudo antropológico do cotidiano da periferia e mostra que, mesmo tendo estudado somente o primário, Carolina sabia o poder transformador da educação e da literatura.
“Quantos mais vão precisar morrer para que essa guerra aos pobres acabe?”, parece uma frase dura, dita por alguém que viveu esta realidade. Era assim que Marielle Franco, em seus discursos na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, apontava as atrocidades diárias nas comunidades cariocas.
Além do ativismo nos coletivos, ruas e universidades, a agenda da parlamentar evidenciava sua luta e seus ideais. Em 15 meses de mandato, Marielle apresentou 16 projetos de lei que versam sobre o combate ao assédio a mulheres nos transportes públicos; criação de mais casas de parto, principalmente nas regiões de menor Índice de Desenvolvimento Humano do Rio; e a criação de um espaço infantil noturno, para mães e pais que trabalham ou estudam a noite pudessem deixar seus filhos. 
Carolina e Marielle eram mulheres negras, mães, oriundas de lugares simples onde a injustiça, pobreza e a violência são panos de fundo. Hoje são conhecidas mundialmente por usarem suas vozes como instrumentos de denúncia a desigualdade social, violência de gênero, os abusos policiais contra os moradores das comunidades, e a ausência do Estado para garantir os direitos básicos para a população pobre. 
Em 2020, a Universidade Federal do Rio de Janeiro reconheceu a relevância de Carolina Maria de Jesus na literatura brasileira, atribuindo à escritora o título de Doutora Honoris Causa.
O assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes completou três anos e continua sem respostas sobre quem são os mandantes do crime. O nome da socióloga é símbolo nas causas pelos direitos humanos, combate ao racismo, feminicídio e homofobia. No Brasil e no mundo diversas homenagens são feitas como forma de enaltecer e relembrar a figura de Marielle.

                                                                                                                       por Valéria Ferreira